Fernando Pieri Leonardo
1. INTRODUÇÃO
O comércio internacional nas últimas décadas cresceu de forma progressiva, pujante. As distâncias se encurtaram, a produção e o consumidor puderam estar em qualquer parte do globo, pois o avanço das comunicações e dos transportes permitiram que se adquirissem produtos fabricados em qualquer parte do planeta. Qualquer empresa pôde exportar seus produtos e qualquer pessoa pôde importá-los de qualquer lugar. O mundo conectado pelas tecnologias desenvolvidas ao longo dos últimos 30, 40 anos permitiu e facilitou esse intenso comércio transfronteiriço. E como os empreendimentos visam atender à demanda, perseguindo o lucro, as empresas buscaram, a todo instante, onde teriam as melhores capacidades de produzirem e distribuírem seus produtos para seus consumidores.
De repente, algo inesperado e imprevisível atingiu a todos, indistintamente. A pandemia provocada pelo coronavírus, denominado Covid-19, assolou a humanidade. A possibilidade da contaminação por transmissão desse vírus, em escala global, invadiu os sistemas em funcionamento tornando o contato físico indesejável e mesmo proibido. Os países se retraíram, fecharam suas fronteiras. As companhias aéreas se viram sem passageiros e sem permissão para entrar e sair de suas origens e de seus destinos. De repente, o mundo parou. Essa descrição poderia ser o início de um filme futurista, daqueles em que ondas gigantes invadem megalópoles e, após duas horas, o expectador levantaria de sua poltrona e seguiria para sua casa comentando sob como seria o mundo se isso acontecesse, ou qual cena mais lhe impactou. Ocorre que a descrição não é ficção, sendo mais uma pequena parte de um dominó de consequências que atingiu a nossa era. Esse momento será marcante para todos nós. Não é a primeira pandemia pela qual passamos, provavelmente não será a última, mas certamente será uma das mais marcantes e mais lembradas.
A mola do comércio internacional é a demanda, o consumo, em última análise, quem produz, produz algo para alguém, seja em grande ou pequena escala, sejam produtos industriais de altíssimo valor agregado, sejam produtos in natura, há uma cadeia produtiva, do início do processo ao consumo final. O vírus interrompeu essa cadeia. O vírus reduziu drasticamente a demanda, o consumo. O vírus impôs isolamento, interrupção das atividades empresariais, sociais, recreativas, obrigou o cancelamento de eventos, de toda natureza, em todas as pontos do globo. A COVID-19 tresmalhou o planeta, tirando tudo do lugar, bagunçando a prateleira global.
A demanda dita o ritmo. Nos tempos de pandemia, o comércio global está super aquecido para os testes para identificação para COVID-19, reclama respiradores, máscaras, luvas e outros produtos da área da saúde. Isso precisa ser produzido, transportado e tem quem queira adquirir e utilizar. Um veículo, por outro lado, passou a ser desnecessário, praticamente por completo. Para que adquirir um veículo novo, se não posso utilizá-lo? Não podemos sair de casa. De outro lado, aceleramos transformações como o uso massivo da tecnologia para comunicação. Nunca se realizaram tantas videoconferências. Quem nunca tinha acessado um aplicativo ou plataforma que permitisse esse tipo de comunicação, viu-se, de inopino, obrigado a baixá-lo em seus equipamentos, familiariza-se com eles, para trabalhar e para qualquer outro objetivo de comunicação seja social, familiar, religioso ou acadêmico. Essas ferramentas se revelaram bálsamo para permitir que pais e filhos, irmãos e amigos, empresas e seus colaboradores mantivessem a comunicação.
A suspensão inicial se alonga. O que seriam dias ou semanas, tem perdurado por meses. De um lockdown, em certos casos, passamos para as restrições mais flexíveis, sempre com recomendações de uso de máscaras e álcool gel, obrigando-nos a entrar no elevador sozinhos, lavar as mãos e higienizar os alimentos adquiridos. Assim estamos vivendo.
O comércio internacional, feito por pessoas e empresas, para pessoas e empresas, tem os meios de comunicação a sua disposição, mas não tem demanda, não tem possibilidade de utilizar o que se produz, pois o mundo mudou. Os interesses mudaram. A roupa cara e chique é despicienda, para ir onde ? Fazer o quê ? Os restaurantes estão fechados. Os museus estão fechados, as óperas não podem ser ouvidas. É tudo em casa. Aulas em casa, lazer em casa. Filhos e pais dividem notebooks, compartilham experiências virtuais, mas, por outro lado, convivem diuturnamente, algo que a vida, como era, não permitia. As viagens de negócio, daqui para ali, saindo cedo para o aeroporto e retornando no final do dia, estão fadadas às memórias. Não existe mais e, certamente, não retornaram. Os espaços profissionais são repensados, todos estamos em home office. E isso, vê-se, funciona.
Nas cadeias logísticas globais, no supply chain, questiona-se se as empresas irão manter o modelo do just in time, qual seja aquele em que a produção está espalhada pelos quatro cantos do planeta e os fluxos de comércio global, com todas as peças e atores interligados funcionando como relógio suíço. Discute-se a mudança para o just in case, ou seja a mudança de estruturas de produção para mais perto dos mercados consumidores e dos seus próprio países, pois manter um modelo de produção concentrado em um único país, no caso a China, nesse cenário de pandemia, revelou-se indesejável. Outrossim, os custos sempre falarão alto e se a mudança for muito onerosa, pode não acontecer e voltaremos a ter a concentração das fábricas nos países, como na China, ou onde sejam alcançados custos menores na produção.
As autoridades também, notadamente, nas áreas de comércio internacional viram-se desafiadas. Os países têm adotado discursos unilaterais, de recolhimento ao seu interior. O Diretor Geral da OMC, Organização Mundial do Comércio – Roberto de Azevedo já anunciou sua saída dessa posição. Ele, cuja linha é multilateralista, partícipe direto da aprovação e assinatura do AFC – Acordo de Facilitação do Comércio, assinado por todos os 164 membros da organização, em Bali, em dezembro de 2003, deixará a função, legando grandes realizações e o desafio para o(a) seu(sua) sucessor(a) de unir os países para falarem do comércio internacional. A OMA, Organização Mundial das Aduanas, outrossim, tem trabalhado fortemente em preconizar e orientar as aduanas globais a adotarem medidas de simplificação inteligente dos controles aduaneiros, como já vinha fazendo, no entanto, com ainda maior intensidade nesse período pandêmico. Sempre, também, com foco no resguardo e na saúde dos agentes aduaneiros no exercício de suas atividades.
E assim o mundo segue, reinventando-se, em todos os setores, nesse cenário que batizamos e estamos acostumando a chamar de Novo Normal. Nessa era, vimos que grandes mudanças na área do controle aduaneiro, do fluxo de mercadorias entre fronteiras está ocorrendo. A agenda da facilitação do comércio, que é global, fica ainda mais relevante, pois é essencial para a retomada das atividades econômicas em níveis mais relevantes. Nesse sentido, a simplificação, a harmonização e a transparência das normas aduaneiras, de controle de entrada e saída de produtos dos países é ainda mais importante. Com a pandemia, muitas mudanças que vinham sendo gestadas, vieram à luz. Exemplo, no Brasil, tivemos com a permissão de verificação remota das mercadorias, com uso de aplicativos que permitissem a Aduana a verificar as cargas em procedimento de desembaraço à distância, sem a necessidade de estarem fisicamente próximos à mesma. Assim também, alterações na legislação aduaneira, passaram a prever a entrega antecipada de produtos importados, mesmo antes da sua conferência aduaneira em áreas alfandegadas, sendo tal permissão direcionada para os OEA’s, empresas certificadas como operadores econômicos autorizados.
Esse programa de origens internacionais, utilizado em praticamente todo o mundo, para selecionar e certificar empresas que representem baixo grau de risco em suas operações de comércio internacional, tanto no enfoque da segurança da cadeia logística, quanto da conformidade aduaneira, será ainda mais relevante no cenário pós pandemia. Através do mesmo, as Aduanas globais são mais eficientes no desempenho de suas relevantes funções. Ao final, por reconhecerem operadores que são de menor risco, as Aduanas passam a focar nos operadores que representam maior grau de risco, permitindo que o comércio legítimo flua com maior rapidez, com menos entraves, com mais previsibilidade e menores custos, ao mesmo tempo que o comércio ilegítimo terá maior possibilidade de ser coibido. Ou seja, o OEA é uma ferramenta essencial para facilitar o comércio global. Facilitação do comércio internacional, cuja agenda, gera crescimento econômico e social para os países, aumento de renda, de arrecadação e de desenvolvimento social. Simplificar os controles aduaneiros, sem perder eficiência, é extremamente relevante. Em um momento de reerguimento da economia global, ainda mais necessário se mostra o fortalecimento dos Programas AEO – Authorized Economic Operator, em todo o mundo, no Brasil, em especial.
Nesse contexto, o programa permite o exercício intenso do gerenciamento do risco aduaneiro. Tal instrumento é fortemente otimizado pelo reconhecimento dos operadores econômicos autorizados. Se a Aduana tem mais informações de um interveniente, poderá realizar com maior eficácia o gerenciamento de risco aduaneiro. Essa é um dos principais instrumentos a permitir um controle aduaneiro eficiente e um comércio global com a fluidez necessária. Ferramenta que conjuga fatores como o uso massivo da TI, a utilização dos grandes bancos de informação digital e o intercâmbio de dados entre as Aduanas permitindo que se reconheçam e beneficiem os operadores que representam esse baixo grau de risco aduaneiro em suas operações.
Nesse contexto, especialmente do gerenciamento de risco e dos Programas OEA’s – operadores econômicos autorizados, fenômeno relevante é a mudança de paradigma da relação Aduana/Setor Privado. Historicamente, essa relação é de tensão e desconfiança. No Brasil, essa tensão sempre foi grande e se agrava em razão da elevada carga tributária incidente nas importações e a ousadia de alguns contribuintes no cometimento de ilícitos.
No campo da reflexão, surge a dúvida se há tanta desconfiança porque o contribuinte comete tantos ilícitos, ou se os ilícitos são cometidos porque a tributação e a atuação fiscal é, por tantas vezes, exacerbada (ou que hajam ou tenham havido, no passado, tantas cobranças inconstitucionais ou ilegais de tributos) e por vezes, o representante do fisco confira interpretações muito favoráveis à maior arrecadação de tributos e à aplicação de penalidades. Não importando tanto a origem, o fato é que a Parceria Setor Público / Setor Privado é uma quebra de paradigma de extrema relevância e que sinaliza uma nova época dessa relação. A aproximação da Aduana e do Setor Privado preconizam um ambiente muito mais promissor para o crescimento econômico, para novos investimentos, para o aperfeiçoamento das práticas aduaneiras em uma relação “ganha/ganha”. E, em tempos de COVID-19 e pós pandemia, esse trabalho em conjunto é imprescindível, ganhando contornos de verdadeira condição para a retomada das atividades de comércio global.
A Aduana depende dos operadores do Comércio Internacional. Os operadores do Comércio Internacional, por sua vez, dependem das Aduanas. Quanto mais confiança, respeito e parceria existir entre os atores públicos e privados, mais ganhos para todos. Nesse norte, o Programa OEA tem, no seu DNA, a aproximação e a parceria entre Aduana e as Empresas.
2. OMA: CONVENÇÃO DE QUITO REVISADA, MARCO SAFE E O PILAR ADUANA – EMPRESA
A OMA foi criada em 15 de dezembro de 1950, por 13 países, sob a denominação mantida até os dias atuais de Conselho de Cooperação Aduaneira (CCA). Responsável pelo estudo e desenvolvimento da temática aduaneira foi no seu âmbito que se desenvolveram as discussões acerca de valoração aduaneira, classificação de mercadorias, origem, regimes e procedimentos aduaneiros. Com a evolução crescente do comércio, outros temas passaram a ocupar a pauta do Conselho e, em 1973, editou-se a Convenção de Quioto – Convenção Internacional para Simplificação e Harmonização dos Regimes Aduaneiros, sendo que ela “incluía, praticamente, toda a temática procedimental aduaneira, da chegada da mercadoria ao território, ou de sua saída deste, aos regimes aplicáveis.”
A Convenção de Quioto de 1973 foi revisada no período de 1995 a 1999 onde se buscou atualizá-la às novas e modernas práticas aduaneiras. O comércio internacional, dinâmico e impulsionado pela demanda e o crescimento das operações internacionais das empresas, cada vez mais globais, trazia constantes novos desafios e a OMA, atenta a realidade, atualizou a Convenção de Quioto, com a sua revisão em entre os anos de 1995 a 1999, tendo entrado em vigor, internacionalmente, 03 de fevereiro de 2006. É reconhecida como o blue print, com recomendação de modernos e eficientes procedimentos para as Aduanas. A sua adoção indica que o país tem, ou trabalha para ter, um ambiente aduaneiro previsível, de segurança jurídica, com constante busca para facilitar o comércio global por suas fronteiras, sem descuidar da segurança. Tal se dá pelos princípios esposados pela CQR – Convenção de Quioto Revisada registrados pela OMA, senão vejamos, em tradução livre:
“A Convenção elabora vários princípios-chave, dentre os quais se destacam:
• transparência e previsibilidade das ações aduaneiras;
• padronização e simplificação da declaração de mercadorias e documentos comprovativos;
• procedimentos simplificados para pessoas autorizadas;
• uso máximo da tecnologia da informação;
• controle aduaneiro mínimo necessário para garantir a conformidade com os regulamentos;
• uso de gerenciamento de riscos e controles baseados em auditoria;
• intervenções coordenadas com outras agências de fronteira;
• parceria com o comércio.
A Convenção de Kyoto revisada promove a facilitação do comércio e controles eficazes por meio de suas disposições legais que detalham a aplicação de procedimentos simples, mas eficientes.”
Nesse sentido também registra Rodrigo Mineiro Fernandes, ao escrever sobre a Aduana e medidas de facilitação comercial:
“A Convenção de Quioto Revisada constitui importante instrumento para promover a facilitação comercial internacional. Em seu preâmbulo, nota-se a preocupação das partes contratantes em contribuir para o desenvolvimento do comércio internacional, através da simplificação, da harmonização dos regimes aduaneiros e das práticas aduaneiras e da promoção da cooperação internacional, com a constatação que os benefícios decorrentes da facilitação do comércio internacional podem ser alcançados sem atentar contra as normas que regem o controle aduaneiro.”
A Convenção de Quioto Revisada, atualmente, já vem sendo submetida a uma “Compreenshive Review” promovida pela OMA, sendo que em novembro de 2018, foi realizado um Evento, em Bruxelas, de que participaram representantes das Aduanas, assim como especialistas do setor privado. Vários temas foram abordados, entre eles inteligência das coisas, block chain, realidade virtual, robótica, mídia social e o futuro da aduana – visando atualizar a CQR, ou atualizar as perspectivas na sua interpretação e aplicação dentro desse cenário atual, de maneira que ela possa se manter como a “flagship convention” (carro-chefe das convenções), como a denominou o Professor Doutor Hans-Michael Wolfgang, da Universidade de Muenster, na Alemanha, em apresentação realizada no referido seminário.
Desde o texto do seu preâmbulo, a CQR já previa, em seus princípios, a cooperação da Aduana com o setor privado, assim como em seu capítulo terceiro, do Anexo Geral, item 3.32, procedimentos especiais para operadores autorizados, isso, portanto, no ano de 1999. Os desafios e a realidade de se buscar simplificação e harmonização das normas aduaneiras, a parceria entre as aduanas, dessa com o setor privado, a segurança e a facilitação comercial exigiram uma nova resposta a partir do atentado terrorista de onze de setembro de 2001. Para essa realidade, notadamente, quanto à ameaça à segurança da cadeia de logística, a resposta da OMA veio através do SAFE Framework of Standards to Secure and Facilitate Global Trade, responsável por um conjunto de padrões de procedimentos que buscaram orientar e auxiliar as Aduanas Globais a enfrentarem o desafio ainda mais latente de garantirem segurança e, simultaneamente, permitirem a facilitação e o desenvolvimento do comércio transfronteiriço.
A Estrutura Normativa SAFE da OMA, conhecida como The SAFE Framework of Standards, reconhece a necessidade de proteger e viabilizar o comércio global legítimo e a necessidade de facilitá-lo, assim como reconhece as ameaças globais, especialmente o terrorismo, bem como o papel preponderante que as Aduanas têm nesse cenário, para viabilizar o primeiro e garantir a segurança em relação às ameaças. A Estrutura SAFE está sustentada em três pilares: a relação aduana – aduana, a parceria aduana – setor privado e o trabalho entre a aduana e outras agências do governo e de outros governos. Dentre seus princípios e objetivos destacam-se o de fortalecer a relação Aduana – Aduana, através do mútuo reconhecimento dos operadores econômicos autorizados e a cooperação entre a Aduana e o Setor Privado.
No pilar Aduana – Empresa ou Setor Privado, o Marco Safe preconiza o trabalho em parceria, com envolvimento do setor privado e o reconhecimento daqueles operadores que apresentam um elevado grau de segurança em suas operações e que a eles possam ser concedidos benefícios em razão dessa condição de operadores confiáveis. É essa, essencialmente, a resposta que o Programa OEA oferece: de um lado os intervenientes demonstrando o baixo grau de risco de suas operações, no aspecto de cumprimento das obrigações aduaneiras e tributárias e, quanto a segurança da cadeia logística e, de outro lado, as Aduanas adotando medidas que facilitem e simplifiquem o fluxo logístico das mercadorias desses operadores. A relação de mútuo respeito pelos papéis desempenhados por cada um e suas responsabilidades são reconhecidos como pedra angular para uma relação bem sucedida entre a Aduana e as Empresas (The cornerstone of successful Customs-to-Business Partnerships relies on several critical factors, accompanied by a mutual respect for each other’s roles and responsibilities in this regard, SAFE FRAMEWORK, IV – Pillar Customs to Business, Chapter 2).
Os desafios crescentes decorrentes dos volumes de operação, das novas formas de negociar, novas formas de se comunicar, novos produtos, tecnologias tornam a solução da questão agilidade/facilitação versus controle/segurança cada vez mais difíceis. As respostas passam, cada vez em maior medida, pela confiança que deve se estabelecer entre aduana e setor privado, e no cerne dessa relação está o programa de OEA, que bem traduz essa aproximação saudável e legítima. A relação Aduana – Empresas tem tamanha relevância e encontra-se tão no cerne dos desafios e soluções, que a OMA possui um Guia específico para orientar seus membros a desenvolverem esse Pilar da Aduana Moderna (http://www.wcoomd.org/-/media/wco/public/global/pdf/topics/facilitation/instruments-and-tools/tools/customs-business-partnership-guidance/customs–business-partnership-guidance.pdf)
Nesse documento a OMA apresenta uma visão ampla para dar suporte a todos os tipos de Administrações Aduaneiras, reconhecendo que há aquelas que já tem uma relação bem desenvolvida e colaborativa com o setor privado, aquelas que são descrentes ou indiferentes acerca dessa relação e àquelas que têm dificuldade e, por vezes, têm uma conflituosa relação com o setor privado. Inobstante os diversos níveis de relação entre as aduanas e os respectivos setores privados, o referido guia adverte, em tradução livre de trecho dos seus princípios:
“O aumento exponencial do comércio global e a dinâmica da cadeia de suprimentos internacional criaram novas demandas e perspectivas sobre o papel das administrações aduaneiras. Enquanto as empresas buscam mover mercadorias mais rapidamente na cadeia de suprimentos a custos reduzidos, as Administrações Aduaneiras são obrigadas a processar volumes crescentes de carga, com menor dependência de intervenção física e com maior eficiência e velocidade, sem comprometer suas responsabilidades de segurança, cobrança e aplicação da lei. Para conseguir isso, há uma necessidade crescente de Administrações Aduaneiras e empresas colaborarem entre si e com outras partes interessadas para garantir que regulamentos, políticas e programas respondam efetivamente a um ambiente em constante mudança. Uma parceria dinâmica é essencial para impulsionar as oportunidades de inovação e crescimento econômico e, ao mesmo tempo, criar uma Administração Aduaneira mais econômica, eficiente e responsiva.”
Sob essa ótica é que iremos analisar o Programa Brasileiro de OEA, considerando avaliando o seu alinhamento e a aderência aos padrões internacionais, principalmente, em relação ao desenvolvimento da parceria Aduana – Setor Privado, nota marcante da Convenção de Quioto Revisada, do Marco Safe e do Guia Aduana – Empresas da OMA. No cenário que vivemos, da COVID-19, os esforços orquestrados de todos, especialmente, o fortalecimento da parceria Setor Público, Setor Privado, figura-se, não como uma alternativa, mas como condição para o recomeço e início dessa nova era do comércio internacional.
3. O PROGRAMA BRASILEIRO DE OEA
Em 2014, em um trabalho de parceria envolvendo a Receita Federal e o Setor Privado foi realizado o Projeto Piloto do OEA – S (Segurança), com seu esperado e aplaudido lançamento no final daquele ano. No ano de 2015, seguindo o planejamento, sobreveio o projeto Piloto do OEA C (conformidade), com duas sub modalidades – C1 e C2, sendo a sub-modalidade nível C1 com menores exigências para sua obtenção, com benefícios reduzidos, assim como a forma de recepcionar, no OEA, as empresas já certificadas Linha Azul. Ao final de 2015, publicou-se a IN 1.598/2015, responsável por revogar a IN 1.521/2014, e estabelecer novos critérios para certificação, assim como as novas modalidades mencionadas. Nessa norma, em 2015, também foi criada a Certificação OEA P (Pleno) para as empresas que fossem certificadas tanto na modalidade segurança, quanto conformidade.
O Programa Brasileiro de OEA está estruturado e regulado pela Instrução Normativa nr. 1.598, publicada no Diário Oficial de 11 de dezembro de 2015. Já foi alterada sete vezes. No texto atual, temos 40 (quarenta) artigos, que abrangem os seguintes títulos: Dos Princípios e dos Objetivos (Arts. 2º e 3º), Dos Intervenientes (Art. 4º), Das Modalidades de Certificação (Arts. 5º a 7º), Dos Benefícios (Arts. 8º a 12o), Da Certificação (Arts. 12-A ao 13-A), Dos Requisitos de Admissibilidade (Art. 14), Dos Critérios de Elegibilidade (Arts. 15 e 16), Dos Prazos (Art. 17), Da Autorização (Arts. 18 e 19), Das Condições para Permanência no Programa OEA (Arts. 20 a 22), Da Revisão da Certificação (Art. 23), Da Exclusão a Pedido do Programa OEA (Arts. 24 e 25), Do Fórum Consultivo (Art. 26), Das Sanções Administrativas e Demais Penalidades (Arts. 27 a 30), Das Disposições Finais e Transitórias (Arts. 31 a 40).
Um aspecto muito relevante do Programa OEA é o fato da adesão ser voluntária. Não se trata de uma habilitação indispensável para se operar no comércio exterior, como é o caso da habilitação no “radar”. Conforme previsão do art. 1o, parágrafo segundo, “O Programa OEA tem caráter voluntário e a não adesão por parte dos intervenientes não implica impedimento ou limitação na atuação do interveniente em operações regulares de comércio exterior”. Essa é uma distinção importante pois já marca a iniciativa por parte do interveniente em se aproximar da Aduana e demonstrar o grau de confiabilidade e de baixo grau de risco das suas operações. O operador que não tem esse perfil não buscará pela Certificação OEA. Outrossim, a norma é expressa ao resguardar todos os direitos dos demais intervenientes, no sentido de que a sua decisão por não aderirem, não lhes acarretará prejuízos. A adesão impõe ônus e oferece vantagens. A não adesão não traz prejuízos. É uma escolha do interveniente certificável.
É também marcante o aspecto inclusivo do programa. Essa característica do Programa também se encontra na indicação das atividades econômicas certificáveis, os denominados intervenientes da cadeia logística internacional certificáveis, a saber: o importador, o exportador, o transportador; o agente de carga; o depositário de mercadoria sob controle aduaneiro em recinto alfandegado; o operador portuário ou aeroportuário, o Recinto Especial para Despacho Aduaneiro de Exportação (Redex), nos termos do artigo 4o, da IN 1.598/15.
Não há requisitos objetivos de volume e valor das operações de importação ou exportação a serem observados; assim como não há condicionantes relativas à receita bruta e ao porte do pretendente, havendo apenas a delimitação das atividades passíveis de serem certificadas, que a empresa esteja exercendo atividade econômica e recolhendo tributos federais há mais de 24 (vinte e quatro) meses, assim como atue como interveniente em atividade passível de certificação por igual período de 24 (vinte e quatro) meses, tudo conforme previsto no artigo 14o, incisos V e VI, que traz os requisitos de admissibilidade ao Programa Brasileiro de OEA.
3.1 PRINCÍPIOS E OBJETIVOS DO PROGRAMA BRASILEIRO DE OEA
Merecem destaque os artigos 2o e 3o da IN 1.598/15. O artigo segundo por enunciar os princípios retores do Programa OEA, e o artigo terceiro, seus objetivos. Vamos a eles. Em relação aos princípios, eles são responsáveis pela ideia nuclear, pelo direcionamento, por dirigir toda a interpretação e aplicação das demais disposições daquele cosmo normativo. Ao estabelecer tais princípios no regramento do programa OEA, a Aduana brasileira definiu seus contornos, sua espinha dorsal. Temos aí a essência do programa. Entendê-la bem é primordial para que possamos dar respostas às eventuais dúvidas e aplicações do restante da legislação sobre o tema. Vejamos, in verbis, o artigo segundo e os onze princípios do Programa OEA: art. 2º O Programa OEA será regido pelos seguintes princípios: I – facilitação; II – agilidade; III – simplificação; IV – transparência; V – confiança; VI – voluntariedade; VII – parceria público-privada; VIII – gestão de riscos; IX – padrões internacionais de segurança; X – conformidade aos procedimentos e à legislação; e XI – ênfase na comunicação por meio digital.
Desde já, indiscutivelmente, nota-se uma disposição expressa de mudar a relação entre a Aduana e o setor privado. Busca-se aí, como alvo, uma relação de parceria (inciso VII), em que haja confiança (V), e seja voluntária (VI); que permita facilitação, agilidade, simplificação e transparência (incisos I, II, III e IV). Ademais, para que tal realidade se concretize, sem renúncia ao indispensável controle aduaneiro, utiliza-se da gestão de risco (VIII) com ênfase na comunicação por meio digital (XI), respeitando e observando os padrões internacionais de segurança (IX) da cadeia logística internacional, e o compliance aduaneiro, focado na conformidade aos procedimentos e à legislação (X).
Nesse quadro, pode-se dizer que a Administração Pública precisa sim apoiar, estimular, facilitar, orientar, contribuir e se mostrar interessada em viabilizar e resolver tudo o quanto lhe for, dentro da estrita legalidade, possível. Toda a sociedade se beneficiará. Não se tenha dúvidas de que o interesse do representante da Aduana com a demanda do setor privado, com o problema que aflige a empresa, o diálogo, a aproximação, a discussão aberta das práticas e das dificuldades no dia a dia, assim como a mudança na forma de enxergar os operadores, adotando a premissa fundamental da boa fé, ao contrário do ponto de partida ser a desconfiança, tem um efeito nítido e importantíssimo no estabelecimento de um ambiente de negócios fértil e promissor, tanto para aqueles que já operam, quanto para a atração de novos investimentos.
Tudo isso, sem dúvida, escudado na gestão de risco aduaneiro. Tratar desigualmente os desiguais é observar as lições de Rui Barbosa, assim como o princípio magno da isonomia, base da nossa Constituição Federal. Nesse sentido, quando se avalia a conduta dos intervenientes, os mesmos se revelam classificáveis dentre os quatro níveis preconizados pela OMA – Organização Mundial das Aduanas, em seu Compêndio sobre o Gerenciamento de Risco. Nele são identificadas quatro categorias de operadores, de acordo com a pré-disposição para o cumprimento das obrigações e, também, as estratégias a serem adotadas pelas Administrações Aduaneiras. As categorias são: (1) aqueles que são voluntariamente cumpridores de suas obrigações; (2) os que tentam ser cumpridores, mas não conseguem sempre obter sucesso em seus esforços; (3) os que evitam o cumprimento sempre que possível; e (4) os que deliberadamente não cumprem. O perfil do OEA é daqueles que são voluntariamente cumpridores de suas obrigações. Não se espera deles o acerto em todas as suas operações, ou seja, a infalibilidade, e sim a busca contínua pelo aperfeiçoamento e a melhoria. Muito mais do que a pretensa perfeição (que gera suspeitas, por razões naturais, na medida em que a indefectibilidade é muito improvável), espera-se o perfil, o desejo, a missão institucional da organização empresarial de agir em conformidade com as normas. Diz com a missão e os valores da organização. Relaciona-se com o compromisso em agir certo, não buscar alternativas que sejam à margem das normas, sem que isso, por óbvio, signifique deixar de lado a busca pelas melhores estratégias de gestão empresarial, a economia lícita de tributos, sempre no pleno respeito às normas vigentes. Respeitadas as regras, mantendo o foco na melhoria contínua, na transparência, na legalidade, na vontade de acertar demonstrada nos procedimentos internos e sua constante revisão, de auditorias internas e externas, de capacitação e treinamento, de políticas anti-corrupção, monitoramento dos colaboradores e adoção de planos de gerenciamento de risco, será o operador admissível e chancelado como um OEA – Operador Econômico Autorizado.
Toda essa realidade, que se busca reconhecer nos intervenientes certificáveis e sua conduta, visa contribuir para serem atingidos os objetivos do Programa OEA, registrados no artigo 3o da IN 1.598/2015.
Essa realidade, do avanço do Programa OEA, foi comemorada recentemente, por ocasião dos seus cinco anos. A Aduana pátria, em conjunto com a iniciativa privada, em um grande evento que contou com a presença de toda Equipe OEA e mais de setecentas pessoas, em São Paulo, na sede da FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, celebrou os resultados desses cinco anos de programa. Em dezembro de 2019, já se contava com a adesão de 459 empresas certificadas, responsáveis pelo registro de 23,23% em quantidade de declarações registradas no mês (DI + DE). Esse percentual é de 27,59%, quando analisada a representatividade desses operadores em moeda nacional. O objetivo é que esses percentuais sejam de 50%, conforme publicado em 2014, no lançamento do Programa OEA. Se hoje, com o percentual de 23,23% das declarações sendo registradas por empresas OEA, o programa já traz tantos benefícios perceptíveis e é celebrado, a expectativa é de que, atingindo a meta das 50% das declarações registradas por OEA, tenhamos um controle aduaneiro ainda mais eficiente, assim entendido como aquele que permite aos operadores que revelam baixo grau de risco o menor tempo de despacho e desembaraço possível, com cada vez maior previsibilidade em suas operações, com outros benefícios agregados, e, de outro lado, uma maior capacidade de fiscalização da Aduana quanto àqueles que representam alto grau de risco aduaneiro, identificando e punindo os operadores que deliberadamente não cumprem as normas.
Para que as empresas se identifiquem com o programa, além de conhecê-lo e acreditarem nele, o que exige a divulgação que tem sido amplamente realizada pela Equipe OEA da Receita Federal e pela iniciativa privada (órgãos de classe, associações, federações do comércio e consultores), é preciso que os benefícios sejam atrativos. Como o OEA não é um regime aduaneiro especial, eis que não altera em nada e de forma alguma, as incidências tributárias, sendo um programa de adesão voluntária que exige investimentos por parte dos interessados, indubitavelmente, é preciso que ofereça vantagens concretas, visíveis e mensuráveis para os operadores. Nesse quesito a legislação traz, nos seus artigos 8o a 12o da IN 1.598/2015, a previsão de benefícios de caráter geral e outros específicos por modalidade de certificação. Dentre os vários benefícios previstos (são oito de caráter geral, cinco para os operadores certificados na modalidade segurança e oito para a modalidade OEA C nível 2), alguns despontam e pesam para a decisão empresarial de adesão.
3.2 BENEFÍCIOS
Dentro do que está sendo visto, aqueles benefícios que conferem maior agilidade, tornando mais fluidos e previsíveis os despachos de exportação e importação são muito valorizados pelas empresas. Esses geram ganhos reais, economia no custo dos produtos, redução dos níveis de estoque, redução de despesas com armazenagem e demurrage. Os benefícios relacionados a isso são, nomeadamente, a parametrização imediata das declarações registradas pelas empresas OEA, o que permite maior celeridade na definição do canal de conferência aduaneira; redução da seleção para canais de conferência que não sejam o verde, assim como a prioridade na análise no caso de seleção para conferência em canais amarelo e vermelho, no caso da importação. Desembaraço sobre águas, conforme prevê o artigo 12, inciso IV, da IN 1598/2015, o que permite seja a carga importada desembaraçada ainda no navio, antes de chegar ao porto de destino. O ganho de celeridade, nesse caso, é enorme. Impõe, outrossim, o ônus aos terminais portuários de que sua operação seja tão célere, quanto o procedimento aduaneiro, sob pena do importador OEA ver o seu benefício esvaziado em razão do tempo que os terminais levarão para movimentarem essa carga para ficarem disponíveis para serem transportadas. Outro benefício de grande relevância para reduzir custos está na dispensa da garantia nos regimes aduaneiros especiais de admissão temporária para utilização econômica (art. 11, inciso II, da IN 1.598/2015). Para os transportadores que se certificarem, conforme artigo 10, inciso IV, da IN 1.598/2015, há previsão de dispensa de garantia para realizarem o trânsito aduaneiro de cargas, portanto, tornando suas operações menos onerosas.
Além dos benefícios já implementados e mencionados, é da característica dos programas OEA agregar novos benefícios. No caso do Programa Brasileiro de OEA, a Receita Federal já anunciou que o mesmo, com a implementação completa da DU-IMP – Declaração Única de Importação, deverá permitir que os importadores OEA Conformidade nível 2 possam recolher os tributos, hoje pagos no momento do registro da DI – Declaração de Importação, periodicamente, uma vez ao mês, por exemplo. Assim como possam prestar menos informações ou mais simplificadas no registro de suas declarações.
Certamente outros benefícios serão somados aos já existentes. É que o Brasil, como signatário do Acordo de Facilitação do Comércio, da OMC, deve observância ao mesmo e, em especial, quanto aos benefícios do programa OEA, ao artigo 7.3 do AFC/OMC, cujas prescrições determinam que pelo menos três das medidas de facilitação indicadas sejam concedidas aos Operadores Autorizados. Vejamos quais são as medidas de facilitação indicadas pelo AFC: 7.3 As medidas de facilitação do comércio estabelecidas nos termos do parágrafo 7.1 incluirão pelo menos três das seguintes medidas : (a) menor exigência de documentação e informação, conforme o caso; (b) menor índice de inspeções e exames físicos, conforme o caso; (c) tempo de liberação agilizado, conforme o caso; (d) pagamento diferido de direitos, tributos e encargos;(e) utilização de garantias globais ou garantias reduzidas; (f) uma declaração aduaneira única para todas as importações ou exportações realizadas em um determinado período; e (g) despacho aduaneiro dos bens nas instalações do operador autorizado ou em outro lugar autorizado pela Aduana.
4. CONCLUSÕES
A realidade de conectividade global sempre exigiu respostas em diversas áreas: saúde, comunicação, transporte, financeira, segurança e também pelas Aduanas. Riscos e ameaças cada vez maiores com o grande fluxo de pessoas e produtos. Premência de que o controle aduaneiro se dê, de forma eficaz, protegendo a sociedade, ao passo que deve ser inteligente e previsível, permitindo que o fluxo ocorra constante e célere.
Nesse escopo e cenário, a OMA atuou, eficazmente, desincumbindo-se de sua missão, orientando e recomendando as melhores práticas, a utilização de diversas ferramentas, e, desde o já longínquo ano de 1973, com a publicação da Convenção de Quioto já se ocupava de fornecer diretrizes aos seus membros para estruturarem uma Aduana inteligente que pudesse ser harmonizada entre si, previsível e eficaz no controle aduaneiro. Em 1999, publica a Revisão da Convenção de Quioto, reconhecida mundialmente como selo de qualidade aduaneiro para os países que a adotam, englobando os melhores procedimentos aduaneiros a serem estudados, conhecidos e implementados pelas Aduanas de toda parte que a essa convenção adiram.
A segurança global passa a ser foco da OMA, notadamente, com o terror de onze de setembro de 2001, nos Estados Unidos, e para responder a essa nova demanda, publica-se o Marco Safe em 2005, que vem sendo revisto a cada três anos, tendo sua última revisão sido realizada em 2018. Nesse diploma, a OMA o sustenta em três pilares, sendo um deles, o pilar da relação Aduana – Empresa (ou Setor Privado), dentro do qual o Programa OEA é essencial. A importância do segundo pilar do Marco Safe é destacada pela OMA na edição, no mesmo ano de 2005, do Guia Aduana – Empresas, para orientar e fortalecer essa relação, por óbvio, por se reconhecer que é condição indispensável para se assegurar um comércio legítimo e seguro, com facilitação comercial e agilidade, sem perda dos controles necessários, que os partícipes do mesmo estejam de mãos dadas, auxiliando-se.
Nesse cenário global, o Programa Brasileiro de OEA insere-se em sintonia, sem destoar, das premissas de parceria entre a Aduana e o Setor Privado. Sua origem e nascimento, por assim dizer, com o Projeto Piloto em 2014 e publicação da IN 1.521 em dezembro daquele ano, foi um trabalho em conjunto da Aduana Brasileira e do Setor Privado. Assim tem permanecido, desde então, com a quebra de paradigma anunciada pelo então Sub Secretário Ernani Argolo Checcucci, um dos grandes responsáveis pela modernização e o alinhamento das práticas aduaneiras brasileiras com as diretrizes internacionais.
A estrutura do Programa OEA Brasileiro, hoje regido pela IN 1.598/2015, é aderente aos padrões da OMA, destacadamente, nos dispositivos em que a relação de confiança entre as partes é privilegiada na voluntariedade de participação, nos princípios e objetivos do Programa, na previsão dos pontos focais, nas visitas de validação, na criação do Fórum Consultivo e possibilidade de participação ativa e manifestação que os operadores OEA têm junto a Aduana. Dessa forma, temos acompanhado de perto o crescimento do programa, trabalhando com empresas em procedimentos de certificação, assim como ministrando treinamentos e realizando palestras. Vemos o fortalecimento da aproximação e da relação de confiança entre a Aduana e o Setor Privado. Prova disso é o interesse e a participação cada vez maior das empresas no Programa OEA e o público de mais de setecentas pessoas por ocasião da celebração dos seus cinco anos. Ficam as advertências, a ambos os partícipes, de que essa relação de confiança é construção contínua e que precisa ser objeto de atenção e cuidado, contínua renovação, a fim de que não retornemos à era das “trevas” em que o pressuposto fiscal era da má fé enraizada no contribuinte, assim como na desconfiança total das empresas de que poderia ter na Aduana um parceiro, com objetivos comuns e preocupado em dar atenção e buscar soluções para as demandas e as dificuldades inerentes ao fluxo internacional de produtos. O saldo é positivo para todos, especialmente, para a sociedade, em última análise.
No Novo Normal essa relação de confiança e parceria, entre atores da cadeia global de comércio, não se revela como uma alternativa a se pensar, mas uma condição a se fortalecer. Vamos retomar as atividades do comércio global, sem sombra de dúvidas, mas claro, com as mudanças e reflexões que a pandemia nos trouxeram.