O Senado Federal aprovou, em 30 de setembro de 2025, o Projeto de Lei Complementar nº 108/2024, de relatoria do Senador Eduardo Braga. O texto, que agora retorna à Câmara dos Deputados para análise final, representa um passo decisivo para a implementação da Reforma Tributária do Consumo, instituída pela Emenda Constitucional nº 132/2023.
A proposta regulamenta aspectos centrais do novo sistema tributário e estabelece as bases para a operacionalização do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) bem como prevê normas gerais do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).
Principais pontos do PLP 108
- Instituição do Comitê Gestor do IBS (CG-IBS)
O projeto institui o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços, órgão público de caráter técnico e independente, sediado em Brasília. Sua criação visa garantir a uniformidade e eficiência da administração do IBS em todo o país, buscando reduzir disputas federativas.
O CG-IBS terá como funções:
- Administrar a arrecadação, compensação e distribuição das receitas do IBS entre Estados, Distrito Federal e Municípios.
- Editar regulamentos e uniformizar a interpretação da legislação do imposto.
- Coordenar a fiscalização e a cobrança administrativa e judicial, em atuação integrada com as administrações tributárias locais.
- Gerir o sistema eletrônico de apuração e crédito tributário.
- Decidir o contencioso administrativo relacionado ao IBS.
Apesar de o desenho institucional buscar o repasse automático das receitas, ainda pairam dúvidas sobre a convivência prática do CG-IBS com as administrações tributárias locais, especialmente nas áreas de fiscalização e cobrança judicial.
- Processo Administrativo Tributário do IBS
O PLP 108 também disciplina o processo administrativo tributário do IBS, com mudanças que buscam modernizar o contencioso.
Entre as novidades, estão a contagem de prazos em dias úteis, a suspensão entre 20 de dezembro e 20 de janeiro, a criação de um rito sumário para causas de menor valor e a exigência de observância de decisões vinculantes do STF. O texto ainda prevê a criação da Câmara Nacional de Integração do Contencioso Administrativo, destinada a uniformizar a jurisprudência relativa ao IBS e à CBS, em julgamentos eletrônicos.
Apesar de representar um avanço em termos de padronização e transparência, o modelo não está isento de críticas. A multiplicidade de instâncias e recursos pode prolongar a tramitação dos processos e enfraquecer o objetivo de simplificação. Além disso, a ausência de mecanismos claros para dirimir conflitos de competência entre o Comitê Gestor e os entes federativos mantém incertezas relevantes, abrindo espaço para disputas que a Reforma buscava superar.
- Distribuição da arrecadação do IBS
O texto detalha o mecanismo de repasse automático da receita aos entes federativos, em consonância com a EC nº 132/2023.
Entre os pontos relevantes:
- Até 2032, os Estados continuam a receber ICMS segundo os índices atuais, servindo como referência para a divisão do IBS a partir de 2033.
- Serão partilhados não apenas os valores arrecadados, mas também rendimentos de aplicações financeiras, juros e multas de mora.
- O seguro-receita, mecanismo para compensar perdas de arrecadação, teve seu prazo estendido até 2096.
- O Fundo de Combate à Pobreza só receberá recursos do IBS a partir de 2033.
Embora busque dar previsibilidade à transição, esse modelo ainda gera preocupação em municípios menores, que temem perda de receitas.
- Normas gerais do ITCMD
Outro ponto relevante do projeto é a fixação de regras nacionais para o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação:
- Fato gerador: transmissões por herança, doação ou instrumentos equivalentes (incluindo estruturas como trusts).
- Base de cálculo: valor de mercado dos bens e direitos transmitidos, com critérios específicos para imóveis, aplicações financeiras e participações societárias.
- Alíquotas: progressivas, observando o teto fixado pelo Senado Federal.
- Imunidades e não incidência: entidades públicas, partidos, templos religiosos, entre outros, permanecem protegidos.
A proposta elimina a aplicação automática da alíquota máxima para grandes patrimônios, adota faixas progressivas e prevê incidência também em operações internacionais de doação e sucessão.
- Ajustes relevantes durante a tramitação no Senado
O parecer do relator do projeto no Senado (Senador Eduardo Braga) incorporou diversas contribuições de parlamentares, governos estaduais e municipais, além de entidades representativas.
Entre os principais ajustes, destacam-se:
- Redução da carga tributária inicial para as Sociedades Anônimas de Futebol (SAFs) – de 4% para 3% da alíquota dos tributos federais unificados, de 1,5% para 1% da alíquota da CBS e de 3% para 1% da alíquota do IBS.
- Maior clareza quanto à responsabilidade das plataformas digitais na emissão de documentos fiscais. A plataforma deixa de estar sujeita aos acréscimos legais e à penalidade decorrente da não emissão do documento fiscal pelo fornecedor, desde que emita o documento e recolha o IBS e a CBS dentro do prazo de até 30 dias. A redação aprovada também delimita os efeitos do cumprimento das obrigações acessórias, preservando a lógica da responsabilidade solidária sem penalizar a plataforma que atua com diligência.
- Regras específicas para setores sensíveis, como combustíveis, medicamentos e programas de fidelidade.
Um ponto polêmico foi a inclusão de limite máximo de 2% para a alíquota sobre bebidas açucaradas. Além da limitação já aprovada na Câmara dos Deputados — que fixou teto de 0,25% nas operações com bens minerais extraídos —, a nova restrição reforça a interpretação de que essas escolhas foram, em grande medida, respostas a pressões setoriais, em detrimento da lógica extrafiscal que inspirou a criação do imposto seletivo.
O projeto retorna agora à Câmara dos Deputados, onde será novamente debatido. A expectativa é de aprovação ainda em 2025, mas o êxito da reforma dependerá de sua aplicação prática, da capacidade de harmonizar interesses federativos e da resistência às exceções que possam comprometer a tão almejada simplificação.
A equipe tributária do HLL & Pieri Advogados está acompanhando cada etapa de perto para orientar nossos clientes com segurança.
Se você quer entender como essas mudanças vão impactar o seu negócio e se preparar para a transição, pode contar conosco.